Dia 21/09/2001
O dia que a casa caiu...
8:30 - Bom, começou até bem o dia. Eu acordei bem cedo para ir à faculdade, porque hoje era o dia de fazer a inscrição, e finalmente ser um aluno oficial do N7, com carteirinha e conta na internet. Chegando lá, é claro que eu esqueci meus atestados de bolsa, e não poderia fazer a bendita inscrição. Peguei a carteirinha de ônibus infinita que o Ferrari tinha comprado só para ir para casa, pegar o papel e voltar (o que dá mais ou menos uma hora).
9:35 – Peguei o ônibus para ir para casa....
9:55 – Já tinha pegado os papéis, e estava já voltando para o centro, dentro do ônibus...
10:15 – Foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida. Eu estava exatamente no momento em que o ônibus parou, para eu descer do ônibus. A porta se abriu, e nesse exato momento o ar ficou mais pesado, como se tivesse feito um vácuo absurdo (meus ouvidos sentiram muito bem isso), tudo tremeu e de repente veio um estrondo enorme, como se uma bomba tivesse estourado a poucos metros de mim. Todos na rua pararam. O trânsito parou. Várias janelas das lojas quebraram. Foi um caos, todos procurando onde tinha sido, pessoas gritando, chorando, achando que tinha sido mais um atentado, ligando pros bombeiros... Eu, achando que era um fenômeno localizado, comecei a correr para a faculdade para ver se eu ainda pegava a inscrição, e contava para todos o que tinha acontecido. Liguei para o Ivan. Ele me disse que estavam evacuando tudo. (Porque evacuar? A bomba tinha sido lá no centro!). Quando eu estou indo para lá, vejo todo mundo na rua, tudo estava sendo evacuado mesmo... Bizarro perceber algo do estilo... Cheguei lá, e todos achavam que a bomba tinha sido ali do lado também. Quando falei que eu tinha escutado lá do centro, começaram a pensar que a bomba tinha sido no metrô ou algo assim. Todos foram mandados para casa... No momento em que a gente estava indo mesmo para casa, que fica mais ao sul, um dos franceses amigo nosso veio correndo para nos parar e falar que tinha explodido uma indústria química no sul, e que tinha uma nuvem tóxica andando por lá, e que não deveríamos voltar logo para casa... Fomos então para a casa de um outro cara que era ali perto, para ver tv e ver se obteríamos mais informações. Ele estava dormindo... Impressionante como alguém conseguiria dormir em um momento desses, com tudo tremendo. Realmente, na tv vimos que tinha sido uma explosão ao sul, em uma fábrica mesmo. Vimos também um programa (que eu tinha visto ontem há noite) que mostra um monte de mulher fazendo audição para ver se são as próximas ‘Popstar’. Foi engraçado ver os comentários dos franceses para essas mulheres...
Bom, saindo de lá a gente resolveu aceitar o convite do francês que tinha ido nos chamar e ir para a casa dele, que fica perto da prefeitura daqui. No caminho a gente comeu uns sanduíches, porque não iríamos tão cedo para casa. Foi meio estranho, porque parecia uma guerra. Todo mundo andando para casa desesperado, muitos com lencinhos ou máscaras no nariz para se proteger da nuvem tóxica... Eu estava meio despreocupado porque eu não estava vendo nada, nem sentindo nada... Quando chegamos lá é que vimos na tv o quão horrível estava a situação. A explosão foi ouvida/sentida em um raio de 80 quilômetros... Por isso que toda a cidade achava que a explosão tinha sido do lado... Ficamos lá tentando ligar para casa, sem sucesso. Os pais do Ivan já tinham ouvido na tv lá no Brasil, e já tinham ligado para perguntar se estava tudo bem... De repente, ligam os brasileiros que estavam na residência na hora, falando que tudo lá estava destruído. Óbvio que eu não acreditei a princípio (assim como eu não tinha acreditado naquele atentado terrorista no World Trade Center também). Mas, depois de ele me jurar que era verdade, eu resolvi acreditar... Mesmo assim, fomos para lá para ver o saldo da tragédia. No caminho, a gente viu a quantidade de janelas quebradas e paredes destruídas só com a força da explosão... É impressionante a destruição que causou uma explosão apenas... Imagino no meio de um bombardeio...
Chegando lá, vimos que todo mundo estava na rua, porque tinham interditado o prédio. Exatamente na hora que chegamos eles liberaram para que entrássemos e pegássemos as coisas pessoais, e que não deveríamos ficar lá. Eles iriam reservar uns ginásios para que pudéssemos dormir e tal, mas preferi ligar para o pessoal do INSA, que não sofreu tanto com a explosão... Chegando no prédio é que vimos o tanto que a explosão foi forte. Janelas quebradas era o mínimo. Alguns pedaços do teto tinham caído, algumas janelas, ao invés de quebrar, foram arrancadas da parede, e as mesinhas da cozinha de muita gente tinham sido arrancadas. No meu quarto quase nada aconteceu, na verdade. As minhas duas janelas foram abertas na marra (ou seja, não fecham mais), e um dos vidros quebrou mas não estilhaçou. Eu poderia muito bem ficar por lá... Peguei tudo de valor e fiz uma mochila para passar uns dias fora, e saí. Liguei antes para casa, para que eles não ficassem preocupados (na verdade nem estavam sabendo do acontecido). Falando com o chefão do CROUS, que estava lá auxiliando o pessoal, descobri que talvez demore muito mais que eu pensava para voltarmos para casa... Eles iam fazer uma perícia na estrutura dos prédios para ver se tinha ficado comprometido, e se ficou, provavelmente vamos ter que nos mudar... Isso logo depois de 20 dias de arrumação do lugar... Vamos ver no que vai dar...
Todos os brasileiros que estavam lá partiram para a jornada de 1 hora de caminhada com um monte de coisas nas costas, para chegar onde estou agora... Em Rangueil, mais longe ainda do centro, mas longe o suficiente pelo menos para que não tivesse quebrado nada. Só depois que eu vi a fábrica, e soube onde era, que eu vi o quão grave tinha sido. A indústria ficava a algumas centenas de metros da gente... A força da explosão destruiu várias coisas na faculdade de química, que ficava do lado da nossa residência... Várias pessoas saíram machucadas...
Ficamos 3 em cada quarto aqui, porque 3 dos brasileiros estão viajando e não deixaram a chave, mas há um outro brasileiro, em um esquema diferente, que também está aqui. Fizemos um acampamento que ainda não sabemos quanto tempo vai durar, porque vai ser difícil ficar se mudando com tudo para outro lugar depois... Vou esperar e ver o que acontece... De qualquer maneira, estou sem casa no momento.
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home